segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Bolsa ainda é a melhor aplicação

Caros leitores,

Com tantas turbulências no mercado financeiro, sobretudo ações, apresento uma entrevista que saiu na última Você/sa de setembro/08 com Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central.



Segundo o economista Gustavo Franco, o investidor amadureceu e não se assusta tanto com o mercado de ações


O economista Gustavo Franco ficou conhecido como o homem que segurou o dólar a 1 real. Isso foi há exatos dez anos, quando ocupava o comando do Banco Central. À frente da Rio Bravo Investimentos desde 2000, gestora carioca de recursos que montou com dois ex-sócios do banco Pactual, ele avalia, nesta entrevista, a evolução da economia brasileira de lá para cá, em especial a do mercado de capitais, e conclui: “A situação é confortável”. Recomenda paciência aos investidores nos momentos de turbulência. E reitera: “A melhor aplicação, hoje, é a bolsa”.

O Brasil recebeu o grau de investimento, mas a bolsa vem andando de lado. Existe aí uma boa oportunidade para comprar ações agora?
Sim, existe uma oportunidade maravilhosa. O índice Dow Jones [da Bolsa de Nova York] está hoje no mesmo patamar de 2000. A bolsa brasileira, naquela ocasião, estava na faixa de 8 000 pontos. Hoje, o Ibovespa gira em torno dos 60 000 pontos. Não há dúvida de que fizemos um progresso extraordinário. Em 1993, era possível comprar todas as empresas do Ibovespa com um cheque de cerca de 85 bilhões de dólares. Hoje, esse mesmo conjunto de empresas vale 1,6 trilhão de dólares.

Há espaço para a Bovespa subir mais?
O que os analistas fazem são comparações internacionais, às quais chamam de múltiplos. Eles calculam quantos anos de faturamento custa uma siderúrgica na Coréia, por exemplo, e quantos anos ela custaria no Brasil. Em tese, deveria ser o mesmo resultado, guardadas as diferenças entre os dois países. Mas comparando o Brasil mundo, as empresas daqui esperado delas um crescimento

Voltando um pouco no tempo, que balanço o senhor faz do mercado de capitais brasileiro nesses últimos dez anos?
Os números não só um histórico extraordinário de valorização das companhias brasileiras como também há uma evolução institucional extremamente favorável. Do ponto de vista da regulamentação, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) é uma instituição muito mais poderosa, competente e estruturada. Do ponto de vista das empresas, basta observar que temos exatas 100 companhias listadas no novo mercado, que adotaram práticas de governança corporativa e estão entre as melhores do mundo. Quando o novo mercado foi inventado não se vislumbrava tamanho sucesso. Em outros países, a iniciativa de se fazer uma listagem diferenciada não funcionou tão bem.

A indústria de fundos de investimento evoluiu nesse mesmo ritmo?
A indústria de fundos, que foi muito afetada pelo passado inflacionário e pela natureza da dívida pública brasileira, atualmente está superdesenvolvida. Tanta popularidade dos fundos de investimento até capturou um pouco do interesse que deveria ser destinado a outros ativos financeiros. No futuro, essa concentração de recursos em fundos vai vazar para outros instrumentos, como a própria bolsa e ativos lastreados em imóveis.

Os
fundos multimercado viraram uma febre, mas nos últimos meses amargam baixa rentabilidade e resgates. O que está acontecendo?
Os multimercado eram, no início, muito focados em operar juros e câmbio. Tiveram uma vida relativamente fácil porque essas variáveis permitiam estratégias direcionais sem muito mistério. Nos últimos anos, houve uma mudança importante, que foi a subida da bolsa. A expertise em ações nunca esteve presente nesses multimercado. A maior parte deles era extensão das tesourarias dos bancos com profissionais que vieram de lá e que não sabiam nem operar na bolsa. O que estamos vendo hoje é uma certa modificação dessa indústria, em que os multimercado estão mais focados em bolsa. E esses, sim, são os mais bem-sucedidos.

Até algum tempo atrás, a bolsa era vista por muitos como um cassino. Por que esse entendimento mudou?
Uma coisa que não muda é a instabilidade desse tipo de mercado. Não existe investimento bom sem risco, e isso o investidor brasileiro já compreende perfeitamente. O que talvez seja diferente hoje é que o mercado de ações inspira uma confiança que não existia antigamente. O mercado tem uma dimensão diferente daquela lá de trás, quando, por exemplo, a Bolsa do Rio quebrou. Não existem mais conspirações nem manipuladores. Agora, temos uma das maiores bolsas do mundo, que também adota as melhores práticas mundiais. O olhar que a sociedade tem sobre essas instituições é de merecida confiança.

Depois de cinco anos consecutivos de alta, a Bovespa enfrenta turbulências e deixa assustado o investidor novato. Quais os principais erros cometidos nessas situações e como evitá-los?
O erro típico é vender ações em momentos de turbulência. O investidor até pode ter comprado mal uma ação, como num IPO [lançamento inicial de ações], que nunca é barato, e ainda assim a melhor coisa a fazer é esperar. As empresas vão continuar funcionando, vendendo, crescendo e pagando dividendos. O investidor, às vezes, nem leva em conta o que vem recebendo. O segredo, portanto, é ter paciência.

O investidor deve ter uma postura mais cautelosa daqui para a frente, ou a tendência de maior tomada de risco permanece?
A bolsa oferece boas oportunidades de compra para o investidor e o mesmo vale para os fundos de ações e multimercado com ênfase em ações. Aqui, na Rio Bravo, estamos vendo muitos papéis baratos e comprando. Essas coisas daqui a pouco vão para cima porque não têm como cair muito mais. É uma questão de acreditar nos fundamentos econômicos das empresas e do país.

Para um investidor que tem disponível entre 10 000 e 20 000 reais, qual aplicação o senhor recomendaria?
A melhor aplicação hoje é a bolsa. Para o pequeno investidor, há duas alternativas. Uma é lidar diretamente com a compra de ações de uma companhia. É interessante como experiência acompanhar seu desempenho, participar de assembléias. Isso tudo faz parte da educação financeira e é muito positivo. Para quem não quer ter esse trabalho, a melhor alternativa é aplicar em um fundo. O aplicador estará contratando um profissional que vai fazer as escolhas e acompanhamentos por ele. A dificuldade é que a aplicação mínima exigida é maior, na faixa de 50 000 reais. Escolher um fundo, porém, é uma decisão tão importante quanto escolher uma ação. O investidor terá que gastar um pouco do seu tempo para olhar diferentes gestores, ouvir conselhos e formar os próprios critérios. É preciso ter convicção na escolha, pois esse gestor vai acompanhá- lo durante algum tempo. Fundo de ação não é para entrar e sair dois meses depois. É namoro longo, tem que ter certeza de que conhece bem.

O senhor já lançou livros com os pensamentos econômicos de Fernando Pessoa e Machado de Assis. Está preparando algum outro?
Estou trabalhando em dois projetos. Um que deve estar pronto no começo de dezembro é a reedição de um livro que foi publicado nos anos 50, sobre um episódio ocorrido em Portugal, em 1925, com um senhor chamado Alves Reis. Esse homem criou, na essência, um processo de falsificação de dinheiro. Ele se fez passar por emissário do Banco Central português e conseguiu fazer uma encomenda de dinheiro legítimo em uma quantidade absurda, de tal maneira que acabou organizando um banco e fazendo uma espécie de política monetária paralela à do governo. Isso criou uma quizumba sem tamanho na economia portuguesa. Depois de descoberto o esquema, uma série de questões conceituais importantes sobre a natureza do dinheiro começou a ser levantada. Parece um romance policial dos bons, mas a história é verídica. O outro livro é uma tradução de Shakespeare, que se vem adicionar à mesma coleção de Machado e Pessoa, grandes autores da literatura.

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