terça-feira, 12 de julho de 2011

Falta pessoal e estrutura para inovação brasileira

País atrai investimentos em função do mercado, mas não tem ainda uma boa estrutura para pesquisa científica e desenvolvimento de tecnologia.

Dados apresentados no livro “Inovações tecnológicas no Brasil” (Ed. Cultura Acadêmica, 2011), da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa) mostram que o número de doutores no Brasil é baixo e isso gera impacto para o crescimento de pesquisa e inovação dentro das empresas.

Por outro lado, segundo levantamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), o número de mestres e doutores titulados no Brasil dobrou no período de 2001 a 2010. A quantidade de pesquisadores formados por ano no País passou de 26 mil para 53 mil. De acordo com o órgão, só em 2010, 12 mil receberam o título de doutor e 41 mil o de mestre.

E há ainda a percepção de alguns especialistas de que muitos desses mestres e doutores não conseguem se inserir nas empresas por falta de sintonia com temas que realmente tem relevância.

“Há escassez de doutores preparados para atividades em empresas e há um desemprego de doutores cujo principal critério de avaliação de progresso é a publicação de "papers" em periódicos de alto impacto. Infelizmente, estamos confundindo qualidade com os indicadores de popularidade de temas. As revistas de engenharia de materiais têm fatores de impacto menores que as de ciência dos materiais. Os jovens pesquisadores sabem disso e concentram-se em temas que lhes dêem acesso às revistas de alto impacto - mas que não preparam o seu caminho para o trabalho de pesquisa & desenvolvimento & inovação. Isso acaba esterilizando muitos talentos”, alerta o professor Fernando Galembeck, da Unicamp, autor de um dos artigos do livro.

As empresas têm, muitas vezes, mais agilidade que os governos para fomentar a pesquisa. Quando uma empresa procura e emprega pessoal qualificado, ela dá o sinal mais forte e mais positivo possível para motivar estudantes a qualificarem-se. “Tenho testemunhado e participado de um trabalho bastante intenso de empresas, em busca da qualificação de seu pessoal. "O programa da Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química) chamado Pacto Nacional da Indústria Química é notável por ser um programa de longo prazo, até 2020, e por trabalhar com projeções muito completas. É o tipo de programa que poderia se esperar do governo, mas que não existe. Além disso, os impostos no Brasil são pesados, para quase todos.”, afirma Galembeck.

Fábio Gandour, cientista-chefe da IBM do Brasil, afirma também que o Brasil se beneficia pouco das inovações que faz e que o empresário brasileiro é por si só inovador, mas peca na hora de mensurar e registrar projetos. “Falta às empresas brasileiras enxergar a ciência como negócio, dirigindo suas práticas operacionais única e exclusivamente para o retorno do que se está investindo”, diz Gandour, que participou recentemente do Fórum HSM de Inovação e Crescimento 2011.
Para o professor Galembeck da Unicamp, a falta de conhecimento e de compreensão do mundo extra-escolar e extra-universitário é a maior dificuldade para pesquisadores se inserirem no setor privado. “Um ponto que para mim é crucial: estudantes e recém-formados brasileiros, com grande frequência, nunca leram um documento de patente. Leram papers, livros, notas de aula, mas não leram boletins técnicos de empresas. Desconhecem noções simples de gestão e valores de mercado. Por essa razão, uma boa parte dos pesquisadores acadêmicos que pensam em interagir com empresas tem enormes dificuldades de diálogo,” completa.

Investimentos voltados para o mercado

Autor de outro artigo na mesma publicação, o professor Sérgio Queiroz, também da Unicamp, defende que os investimentos de multinacionais seguem por duas vias principais: aqueles atraídos pelas oportunidades de mercado e aqueles atraídos pela tecnologia. No caso do Brasil ainda estamos mais situados na primeira opção. As multinacionais investem no Brasil por haver oportunidades de mercado. Queiroz cita como exemplo a indústria automobilística, que tem um mercado amplo aqui e precisa investir em pesquisa para adaptar seus carros às condições e legislação do país.

Existem fatores decisivos para atrair esses investimentos e o principal é a mão de obra qualificada. Outros fatores são centros de pesquisa, fomento nas universidades e programas sólidos de aquisição de conhecimento. Essa estrutura o Brasil não tem. “A China e a Índia estão à frente nessa questão por possuírem uma estrutura melhor de pesquisa e pessoal qualificado. No caso da China, houve um grande avanço em um curto espaço de tempo. O país está criando grandes parques científicos e universidades avançadas, pois percebeu que isso atrairia mais investimentos”, relata.

Queiroz acredita que nos próximos dez anos o Brasil ainda terá mais investimentos em função do mercado, mas há aí uma possibilidade de reforçar a interação com centros de pesquisa e, mais adiante, melhorar os investimentos no potencial de pesquisa.

A conclusão é que, embora o número de doutores e de trabalhos científicos esteja aumentando no país, ainda há um longo caminho para estruturar o setor de P&D e proporcionar tanto maiores investimentos como melhores oportunidades para os profissionais que se interessam pela área de pesquisa.

Portal HSM

Nenhum comentário: